quarta-feira, 3 de junho de 2009

Quel horrare!

Mamãe, como escrever sobre um sentimento sem ser necrófilo? Explique-se... É que o sentimento é uma idéia que morre transposta em ser palavra. Se seguires a lógica... Não quero saber de lógica!, quero conhecer o mundo e saber se dele posso ter algum sentimento. Não o compreendo... Deixe para lá!, ninguém entende.
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Anômalos

Jessikha W. Todt

Me revolta a falta de ação,
Então lhe entrego a faca e peço que corte minhas mãos.
O sangue que suja não voltará às veias.
As veias secam.
Nada se altera.

As mãos apodrecem na calçada.
O fedor entorpece.
A náusea beira alucinação.
Os que passam fingem não sentir,
E os que sentem parecem que não passam por ali.
Nada se altera.

O tempo faz desaparecer a carne.
Os vermes se transformam em lindas moscas, e voam até outros mortos.
Os restos, os ossos, são arrastados pelos vira-latas.
Agora são brinquedos de cãezinhos famintos,
Perdidos em todas as esquinas
Roendo, roendo os últimos vestígios.
Para sempre esquecidos.
Nada se altera.

E um corpo sem mãos caminha.
As veias secas.
A boca muda,
Grita por onde passa com a voz do silêncio que acusa,
Os mutantes sem ouvidos,
Os mutantes sem olhos,
Caminham com as mãos intactas nos pulsos.
As veias inchadas de vermelho.
Mutantes possuem muitas veias,
Prontas para explodir.
A hipocrisia famélica rondando,
Amimando os mutantes envelhecidos
Que lembram alegremente do passado longínquo,
E esperam ansiosamente por um futuro imprevisto.
Nada se altera.
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Uma campa aguarda a apatia. Mas a apatia não vem, só deixa corpos aí no seu futuro lugar antes do final juízo...

Aquila non captat muscas.

Um comentário:

O repórter disse...

Lembro-me desse! "lindas moscas". Por que uma mosca não há de ser linda? Assim é o poema: seco e cheio, rijo, deleitoso,revolto e recurvo. Muito bom!

Para onde o corpo sem mão caminha? Não sei. Apenas atormento meu ócio para que meu ocelo possa afligir.